Vivência Afetiva com Alimentos: Estratégia de Sensibilização em Ação Educativa com Adolescentes Obesos
 

A educação nutricional requer estratégias que modifiquem a percepção do obeso relacionada aos alimentos. Quando é realizada em grupo favorece: rompimento de comportamentos cristalizados e compartilhamento de experiências. A vivência afetiva com os alimentos é uma ação pedagógica grupal que contribui para resgatar elementos da subjetividade humana. Objetivo:

Aproximar os adolescentes dos alimentos, de forma que não carregassem sentimentos ambíguos de desejo, repulsa e culpa. O método consistiu na vendagem dos olhos dos participantes do grupo, seguida do oferecimento de alimentos que foram manipulados, cheirados e degustados, a fim de redescobri-los em um contexto isento de pré-conceitos.

Verificou-se, mediante a dinâmica, que os adolescentes não estão acostumados a explorar as qualidades organolépticas dos alimentos; alguns alimentos comercializados, divulgados pela mídia, não foram reconhecidos por eles, causando-lhes estranheza (exemplo: refrigerante e maionese); conscientizaram-se de que comem sem perceber o alimento na sua totalidade (características físicas, sabor e aroma); expressaram dificuldade na identificação das frutas, apesar de apreciadas e a mastigação foi valorizada. A experiência proporcionou o rompimento de concepções cristalizadas a respeito de alimentos desejados e indesejados.

O comportamento alimentar é multidimensional, pois inclui, além dos componentes físicos – os próprios alimentos e os órgãos dos sentidos responsáveis pela capacidade de percepção sensorial, uma ampla gama de disposições psíquicas e culturais que influenciam as práticas alimentares e a própria percepção dos alimentos.

O comportamento alimentar abrange “procedimentos relacionados às práticas alimentares de grupos humanos (o que se come, quanto, como, quando, onde e com quem se come: a seleção de alimentos e os aspectos referentes ao preparo da comida) associados a atributos sócio-culturais, ou seja, aos aspectos subjetivos, individuais e coletivos relacionados ao comer e à comida, quais sejam: alimentos e preparações apropriadas para situações diversas, escolhas alimentares, combinação de alimentos, comida desejada e apreciada, valores atribuídos a alimentos e pre parações e aquilo que pensamos que comemos ou que gostaríamos de ter comido (Garcia, 1999).

A obesidade na adolescência é um problema complexo que demanda intervenções de várias áreas de conhecimento, dentro de abordagem multidisciplinar. No que concerne à nutrição, a mera transmissão de informações não é suficiente, pois a informação nutricional alcança a dimensão intelectual, e a alimentação, como explicitado acima, envolve muito mais do que isso. Assim, cabe à educação nutricional, o desafio de criar estratégias educativas que não se restrinjam à transmissão de informações, mas possibilitem a criação de novos sentidos para o ato de comer através da mobilização de aspectos que alcancem as várias dimensões do comportamento alimentar (Boog e Magrini, 1999).

A educação no campo da nutrição deve transcender o conhecimento teórico, relativo a conceitos de bioquímica e fisiologia que explicam como o corpo recebe e aproveita alimentos para serem metabolizados. O significado de educar contextualiza uma dimensão maior. Educar, do latim, significa “alimentar”, “nutrir” (Educare, 2004). Nota-se, portanto, a existência de uma aproximação importante e profunda entre educação e nutrição. Para Rousseau, filósofo do século XVIII, (1973), a palavra educação tinha sentido diferente comparado à época contemporânea - educação significava alimento. Os banquetes sinalizavam uma condição de “sociabilidade” entre educadores e educandos.

Abordando a educação nutricional no sentido de iniciação numa sensibilidade, o profissional vai ao encontro dos pressupostos pedagógicos que contemplam valores subjetivos e afastam elementos reducionistas na prática educativa em saúde, lembrando que essa postura não descaracteriza o processo critico de aprendizagem, ao contrário, age como facilitador na compreensão dos determinantes das práticas e atitudes em relação ao comer.

Com base no trabalho desenvolvido por Whapeha e Harris (1983) sobre combinação de abordagens tradicionais e não tradicionais no aconselhamento dietético, foi desenvolvida uma ação pedagógica com o propósito de possibilitar a adolescentes obesos uma interação com os alimentos diferente daquela a que estão habituados, geralmente carregada de sentimentos ambíguos de desejo, repulsa e culpa, que marcam a relação do obeso com a sua alimentação.

A técnica proposta por Whapeha e Harris baseia-se no biofeedback e consiste em proporcionar experiências, no caso com alimentos, que permitam aos sujeitos tomar consciência dos sinais de resposta de seu próprio corpo aos estímulos apresentados, levando ao re-descobrimento desse objeto (o alimento) sob outros prismas.

 

 
Autores
 
Dra. Érika Marafon Rodrigues
Nutricionista, Mestre em Enfermagem, Pesquisadora do Grupo A3EN (Apoio, Aprimoramento e Atualização em Educação Nutricional) vinculado ao Departamento de Enfermagem/FCM/UNICAMP - UNICAMP.
Dra. Maria Cristina Faber Boog
Doutora em Saúde Pública - USP, Docente do Departamento de Enfermagem – FCM – UNICAMP, Coordenadora do Grupo A3EN (Apoio, Aprimoramento e Atualização em Educação Nutricional) vinculado ao Departamento de Enfermagem/FCM/UNICAMP.

 
Os autores estão em ordem alfabética. Este artigo é um resumo. O artigo em sua íntegra pode ser encontrado na revista Nutrição em Pauta, edição Mai/Jun/2005