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Alimentos Geneticamente Modificados - Um Assunto Polêmico
 

Alimentos Transgênicos - Dr. Aluízio Borém / Dra. Neuza Maria Brunoro Costa / Dra. Raquel Monteiro Cordeiro de Azeredo

Organismos transgênicos ou geneticamente modificados são aqueles produzidos pelas técnicas do DNA recombinante, onde genes de um organismo são transferidos para outro de forma precisa e pontual (Borém et al, 2003).

A modificação genética das espécies vegetais vem ocorrendo por ação do processo evolutivo e por meio da intervenção dos melhoristas, ao selecionarem tipos mais adequados às necessidades do homem (Borém, 2001). O melhoramento de plantas baseado na genética clássica de Gregor Mendel normalmente é realizado por meio de cruzamento entre variedades com características superiores ou dessas com seus parentes silvestres. Desta forma foi possível o desenvolvimento de variedades mais produtivas, nutritivas e resistentes a pragas e doenças. Como resultado, hoje estão disponíveis variedades de frutas que até há algumas décadas só podiam ser encontradas no mercado brasileiro mediante sua importação, como é o caso das maçãs.

Em 1953 Watson e Crick descobriram a estrutura tridimensional do DNA. Desde então, o homem vem obtendo um magnífico progresso no entendimento do material genético dos seres vivos. Vinte anos depois de Mendel, foram descobertas as enzimas de restrição, ferramenta utilizada na engenharia genética, abrindo as portas para uma forma precisa de se desenvolver variedades. Assim, novas técnicas de biologia molecular desenvolvidas pelos cientistas, têm permitido aos geneticistas obter variedades até então existentes apenas nos sonhos dos melhoristas. Variedades de arroz ricas em b-caroteno, precursor da vitamina A, variedades resistentes a pragas e vírus etc (Borém, 2001).

Até alguns anos atrás, os únicos tipos de engenheiros que seriam listados sem muito esforço seriam: civil, hidráulico, agrícola, mecânico, elétrico, de alimentos, de minas, de agrimensura. Com o avanço tecnológico, outros tipos de engenheiros surgiram: eletrônico, mecatrônico, nuclear e genético, dentre outros. Cada um desses profissionais utiliza diferentes ferramentas para executar sua obra de engenharia. Alguns profissionais usam teodolito e outros, sismógrafos, equipamentos de ressonância magnética etc. O engenheiro genético constrói genes em vez de pontes, edifícios, carros etc. A engenharia genética objetiva a manipulação do DNA de forma precisa, em laboratórios, com o intuito de se desenvolverem variedades mais adequadas às necessidades do homem (Borém & Santos, 2003).

Hoje, a sociedade é testemunha de que a biotecnologia desenvolveu produtos e serviços com impacto na vida do produtor rural e dos consumidores em vários países. As variedades transgênicas de soja, milho, algodão, canola, mamão, arroz, tomate e várias outras espécies vêm conquistando a preferência de agricultores desde que a primeira variedade transgênica, o tomate "Flavr Savr", lançado em maio de 1994, atingiu o mercado. O censo agrícola de 2002 registrou que mais de 59,7 milhões de hectares foram plantados com variedades transgênicas no mundo, caracterizando um contínuo crescimento na área ocupada com essas variedades. De acordo com o USDA, a controvérsia em torno do plantio de transgênicos aparentemente não diminuiu o desejo de os produtores americanos plantarem variedades geneticamente modificadas (James, 2002).

Até o presente, a maioria das variedades desenvolvidas pela biotecnologia possui tolerância a herbicidas, resistência a insetos e vírus. Entretanto, as primeiras variedades nutracêuticas, como o arroz dourado – rico em b-caroteno, começam a chegar aos consumidores (Borém & Santos, 2003).

O objetivo da biotecnologia aplicada aos alimentos não é somente melhorar a produção de alimentos, mas também atender à demanda dos consumidores por produtos mais seguros, naturais, frescos, saborosos e convenientes (Kuipers, 1999). A maioria das pesquisas em melhoramento de plantas das duas últimas décadas tem sido direcionada para aumentar a produtividade e resistência a doenças e pragas. Mais recentemente, e evidenciando um excelente potencial, a aplicação de biotecnologia às plantas vem sendo direcionada para aumentar sua qualidade nutricional, de forma a produzir alimentos nutricionalmente fortificados e substituindo a adição de constituintes sintéticos aos alimentos (Zimmermann & Hurrel, 2002). A biotecnologia permite ainda a produção de alimentos com maior valor funcional e com aplicações na prevenção e tratamento de doenças.

Diversas alterações têm sido produzidas ao longo do tempo no sentido de melhorar o teor e a qualidade protéica dos alimentos através de técnicas convencionais de melhoramento genético. Mais recentemente, o uso de transgênicos possibilitou introduzir na batata um gene que codifica uma proteína específica da semente, rica em aminoácidos essenciais e não-alergênica, AmA1, do amarantos (Amaranthus hipochondriacus). Com isso, obteve-se um aumento de 2,5 a 4 vezes nos teores de lisina, metionina, cisteína e tirosina na batata (Chakraborty et al., 2000). Portanto, a introdução desse gene possibilita aumento do valor protéico da batata, com perfil de aminoácidos essenciais semelhante ao padrão estabelecido pela FAO/OMS.

Quanto aos lipídios, a biotecnologia tem permitido a manipulação do perfil de ácidos graxos, trazendo benefícios nutricionais, tanto para a indústria de alimentos quanto para a indústria química. Para a indústria de alimentos, o aumento da relação entre ácidos graxos saturados e polinsaturados é desejável, a fim de evitar a hidrogenação e, conseqüentemente, a formação de isômeros trans; no entanto, essa modificação é indesejável do ponto de vista nutricional. Para obter benefícios, como a redução do colesterol sangüíneo e formação de prostaglandinas, a produção de ácidos graxos polinsaturados de cadeia longa, como o docosaexaenóico (DHA) e ecosapentaenóico (EPA), é desejável. Nesse aspecto, o isolamento da enzima D5 dessaturase, a partir do fungo Mortirella aplina, torna-se promissor na engenharia genética para a conversão do ácido linoléico em araquidônico, que é um precursor para a produção de eicosanóides, como prostaglandinas, leucotrienos e tromboxanas (Liu et al., 2002).

Embora apresentem efeitos benéficos nutricionais, os óleos insaturados são muito instáveis a altas temperaturas de cocção. O melhoramento convencional tem produzido óleos de girassol e amendoim ricos em ácido oléico, os quais são normalmente ricos em ácido linoléico. Por meio de mutações feitas em sementes de girassol, o conteúdo de ácido oléico aumentou de 29 para 84%. Mutantes da soja com menores teores de ácido palmítico e maiores teores de ácido esteárico têm sido obtidos (Liu et al., 2002). Essas alterações no perfil de ácidos graxos, aumentando o teor de ácidos graxos monoinsaturados e reduzindo o teor de ácido palmítico, têm implicações na redução do risco de doenças cardiovasculares.

A fortificação de alimentos com minerais é outra aplicação da biotecnologia. Embora tenha suas aplicações, a suplementação medicamentosa é geralmente associada a efeitos colaterais, e a fortificação pode provocar alterações da cor e sabor do produto ou baixa biodisponibilidade de nutrientes. O enriquecimento com ferro, através do melhoramento genético ou da biotecnologia, tem sido uma alternativa com perspectivas sustentáveis para alimentos que fazem parte da dieta básica de populações, substituindo os suplementos dietéticos ou a fortificação de alimentos. Oferece, ainda, a possibilidade de aumentar a produtividade, que geralmente é limitada pela deficiência mineral da planta (Grotz & Guerinot, 2002). Outra opção para aumentar o conteúdo de ferro em plantas é a introdução de ácido ascórbico, hemoglobina e peptídeos contendo cisteína no tecido vegetal (Zimmermann & Hurrel, 2002).

A biotecnologia oferece ainda perspectivas de melhorias como a produção de arroz, mandioca, mostarda, canola e outros, com maior teor em b-caroteno, bem como de tomate com maior teor em licopeno, aumentando, sobretudo a propriedade antioxidante desses alimentos (Zimmermann & Hurrel, 2002; Graham et al., 1999). O aumento do teor de a-tocoferol em detrimento a outras formas de vitamina E, constitui uma forma promissora para aumento da atividade da vitamina nos alimentos (Rocheford et al., 2002).

O valor nutricional dos alimentos pode ser melhorado com a redução de fatores anti-nutricionais, como fitato, inibidores de proteases, lipoxigenases, tanino, glicosídios cianogênicos e outros. O emprego da biotecnologia pode trazer esses benefícios, como é o caso do aumento da produção de fitase, enzima que degrada o fitato, nos alimentos, promovendo o aumento da biodisponibilidade de ferro, zinco e fósforo tanto para a planta como para o consumidor (Grahan et al., 1999; Brinch-Pederson et al., 2002).

O aumento do valor funcional dos alimentos também é alvo da biotecnologia. Assim, pesquisas têm sido desenvolvidas no sentido de aumentar a conversão da sacarose em frutoologossacarídeos em beterraba. Esses prebióticos não são digeridos no trato gastrointestinal, reduzindo o valor energético, além de promover a maior produção de ácidos graxos de cadeia curta em função da sua fermentação. Dentre esses ácidos graxos, o propionato tem a propriedade de reduzir o colesterol sanguíneo (Sévenier et al., 2002). Os prebióticos favorecem o crescimento de bactérias probióticas, que também podem ser manipuladas pela biotecnologia, tornando-se mais resistentes ao processamento do alimento.

Os flavonóides são antioxidantes abundantes no reino vegetal, porém em quantidades pequenas. Suas vias de biossíntese são bem conhecidas, o que os torna passíveis da manipulação genética, visando o aumento do seu teor nos alimentos, assim como nas flores. Fitoestrógenos, como as isoflavonas de soja, também são passíveis de serem produzidos pela engenharia genética, aumentando os benefícios do seu consumo, como redução do colesterol sanguíneo, redução do risco de câncer de mama e de próstata, redução do risco de osteoporose e dos sintomas da menopausa, dentre outros (Forkemann & Martens, 2001).

A biotecnologia pode ser ainda aplicada a produtos de origem animal, visando, dentre outras modificações, à produção de suínos com maior teor de ácidos graxos monoinsaturados e polinsaturados, ao invés de ácidos graxos saturados. É ainda possível a produção de peixes de maior tamanho; animais com maior teor de músculo na carcaça e leite com menor teor de lactose (Bonneau & Laarveld, 1999). Proteínas do leite humano, como lactoferrina e lisozima podem ser produzidas em plantas, como a soja, dando características mais apropriadas quando utilizada para formulações infantis. Vacinas alimentares têm sido desenvolvidas utilizando batata e banana como veículos.

A biotecnologia é um novo instrumento e é preciso que se tenha a consciência de que tecnologias não são, em si, boas ou más. A maneira como a tecnologia é empregada é que pode ser ou não apropriada, boa ou má, trazer riscos ou benefícios. A biotecnologia apresenta grande potencial para a produção de alimentos com melhores propriedades nutricionais e funcionais, entretanto o baixo acesso à literatura científica atualizada acerca das suas possíveis aplicações tem gerado insegurança e resistência de certos indivíduos na aceitação dos seus produtos. A maior lição que devemos aprender é analisar e julgar a segurança de um produto individual derivado da aplicação de uma nova tecnologia ao invés de julgar a tecnologia por si só. Em outras palavras, é a segurança do produto e não a tecnologia que deve ser o foco de avaliação.

Posicionamento do CFN Sobre Alimentos Transgênicos - Dra. Roseane Nascimento

Como profissional responsável pela avaliação da qualidade dos alimentos, o nutricionista enfrenta permanentes desafios determinados pelo incessante surgimento de produtos que concorrem para novos efeitos na saúde humana.

O Conselho Federal de Nutricionistas (CFN) como representante desta categoria profissional mantém a política de dispensar esforços no sentido de acompanhar e avaliar os assuntos relacionados à alimentação e nutrição a fim de fundamentar seu posicionamento, principalmente, em relação a assuntos polêmicos.

Um dos seus objetivos busca, através de publicação de documentos norteadores da prestação de serviços do nutricionista, atender ao anseio da sociedade quanto a esclarecimentos e informações sobre produtos disponibilizados para alimentação.

Nos dias atuais, mediante todas as novidades da ciência que instrui a produção, industrialização e comercialização de gêneros alimentícios, o foco se dirige intensamente para o desenvolvimento tecnológico de Organismos Geneticamente Modificados (OGM), especificamente dos alimentos transgênicos.

Após extensiva análise dos fundamentos prós e contras a produção desses alimentos, sob o enfoque da economia, da proteção ao meio ambiente, da sustentabilidade agrícola e da proteção da saúde humana, o Plenário do CFN decide por manifestar-se contrário à comercialização dos alimentos transgênicos.

O acompanhamento das descobertas científicas e das decisões governamentais não só em relação aos alimentos transgênicos, mas sobre o avanço da biotecnologia alimentar é tarefa permanente do Sistema CFN/CRN, vigilante ao respeito da legislação brasileira, em especial ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor.

A conclusão dos estudos realizados até o momento, aponta para a existência comprovada de efeitos adversos altamente prejudiciais aos diversos elementos do planeta, principalmente para os seres humanos. Neste sentido, o CFN, mediante a missão de contribuir para a saúde da população, entende que alguns benefícios não podem justificar o uso de produtos potencialmente maléficos, mesmo que para poucos.

Neste tempo conclama os nutricionistas a dirigir suas ações para o esclarecimento técnico da sociedade quanto aos riscos potenciais na utilização de alimentos transgênicos, a fim de instruí-la em defesa dos abusos cometidos por decisões públicas pautadas em interesses particulares.

O papel que o nutricionista poderá desempenhar neste cenário é fundamental para o crescimento de uma sociedade saudável no nosso País.

 

 
Autores
 
Dr. Aluízio Borém
Eng.-Agrônomo, M. S., Ph. D. e Professor da Universidade Federal de Viçosa, Conselheiro do CIB
Dra. Neuza Maria Brunoro Costa
Nutricionista, M.S., Ph.D. e Professora da Universidade Federal de Viçosa
Dra. Raquel Monteiro Cordeiro de Azeredo
Bela. em Ciências Domésticas, M. S., D. S. e Professora da Universidade Federal de Viçosa, Conselheira do CIBReferências
Dra. Roseane Nascimento
Presidente do CFN - Conselho Federal de Nutricionistas

 
Os autores estão em ordem alfabética.

Este artigo é um resumo. O artigo em sua íntegra pode ser encontrado na revista Nutrição em Pauta, edição Jul/Ago/2003
 
 

 
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